Opinião
Regulação: um problema complexo da Saúde
Hospital municipal não é a única solução para problema da regulação.
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Luiz Duplat“Para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada”. A frase é do jornalista americano H. L. Mencken (1880-1956), que ficou conhecido por seu sarcasmo e ideias nada convencionais.
O que Mencken diria sobre as postagens completamente erradas e deselegantes que vemos atualmente nas rede sociais, sugerindo soluções simples para diversos problemas complexos, a exemplo da regulação, a chamada “Fila da Morte”? Para ilustrar, transcrevo uma postagem que apareceu no story do meu Instagram no dia de ontem.
Em um card de bonito e elegante design, contendo a imagem de um trabalhador da saúde conduzindo uma maca de transporte de paciente em um corredor hospitalar, havia sobreposto o seguinte texto: “Construção do Hospital Público Municipal de Camaçari. O fim da espera por regulação”.
São muitos os desafios e limitações para um hospital municipal ser a solução para a regulação das urgências. A proposta de construção de um serviço como esse, embora, teoricamente, possa parecer promissora e geradora de visibilidade política do gestor, não se sustenta ao se realizar uma análise técnica. Logo, chega-se à conclusão de que um hospital municipal não é a solução definitiva para o problema da regulação.
A limitação de recursos afeta diretamente a quantidade e qualidade dos serviços prestados, seja na disponibilidade de leitos, seja na capacidade de realizar atendimentos aos usuários. O financiamento da sua instalação e manutenção depende, em parte, das verbas públicas do Ministério da Saúde, e temos em vigor a Emenda Constitucional 95/2026, que congela os investimentos em Saúde até 2036. Portanto, Camaçari não teria financiamento federal para implantação e custeio desse hospital.
A regulação em urgência é complexa, envolve diversos fatores, como o diálogo entre a Central de Regulação, hospitais e UPAs, com o objetivo de ter respostas rápidas para as situações críticas dos pacientes. Apenas a criação de um hospital municipal não garante automaticamente uma qualificação desse processo. É necessário um planejamento minucioso e integrado, liderado pela Secretaria Estadual da Saúde, para garantir a efetiva regulação dos pacientes.
Outro ponto que deve ser analisado é a escassez de profissionais de saúde qualificados. Isso inclui médicos, enfermeiros, técnicos de saúde e outros profissionais indispensáveis para o funcionamento de um hospital. Muitos destes não tiveram uma formação adequada na sua graduação, principalmente para atuar no Sistema Único de Saúde (SUS).
A implantação de um hospital municipal em um município em que já existe um hospital estadual pode provocar uma duplicidade de oferta de serviços, enfraquecendo os dois hospitais. Nesse sentido, é melhor fortalecer o hospital já existente no território ou estabelecer perfis distintos de atendimento desses hospitais, através de uma pactuação aberta e apartidária entre o estado e o município, aproveitando a expertise dos gestores envolvidos, para evitar desperdício de recursos.
Embora a população de Camaçari clame por um hospital municipal, principalmente após o Hospital Geral de Camaçari (HGC) ter passado a atender no formato de “porta fechada”, isto é, somente recebe pacientes via Central de Regulação, é importante reconhecer que, além de ser uma proposta atraente, visando solucionar o complexo problema da regulação, também é de fundamental importância o reconhecimento das dificuldades, desafios e contradições inerentes a essa ideia.
Vale salientar que, quando um candidato a um cargo eletivo faz uma promessa na campanha eleitoral, com desconhecimento da engrenagem da máquina pública, muitas vezes não pode cumpri-la, devido à disponibilidade orçamentária ou mesmo pela sua complexidade, o que demandará soluções diferentes da prometida.
A complexidade da regulação perpassa por um Planejamento Regional Integrado (PRI), que consiste em uma ação estratégica voltada para a ampliação do acesso do usuário, a eficiência, a equidade e a qualidade dos serviços de saúde, com participação do estado, municípios e outros atores interessados em enfrentar os desafios complexos da saúde pública de uma determinada região. O Ministério da Saúde disponibiliza no seu site vasta literatura com as normativas para execução de um PRI.
Portanto, em Camaçari, um PRI envolveria a Secretaria Estadual da Saúde e os municípios da Microrregião de Saúde (Camaçari, Simões Filho, Dias d’Ávila, Mata de São João, Pojuca e Conde). Todos possuem hospitais no seu território, entretanto, dentro de um PRI seria estabelecido um perfil de atendimento para cada um deles, assim como sua integração com os demais serviços de saúde da Microrregião. Dessa forma, fortaleceria os hospitais, e os recursos financeiros seriam alocados adequadamente, resultando em um sistema de regulação em que os usuários do SUS teriam um atendimento mais efetivo, com melhor qualidade e resolutividade.
Luiz Duplat é médico e subsecretário da Saúde de Camaçari.
*Este espaço é plural e tem o objetivo de garantir a difusão de ideias e pensamentos. Os artigos publicados neste ambiente buscam fomentar a liberdade de expressão e livre manifestação do autor(a), no entanto, não necessariamente representam a opinião do Destaque1
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