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Saúde pública e eleição municipal 2020, por Luiz Duplat
Alguns postulantes apresentam como proposta para a saúde pública a reabertura de uma UPA, cujo fechamento sequer aconteceu.
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Luiz DuplatEm meio a pandemia do novo coronavírus, acontecerão as eleições municipais para escolha de prefeitos e vereadores, consolidando o processo de democratização do país, que há poucas décadas saiu de um governo militar ditatorial.
É comum que, a cada eleição, um tema assuma a liderança das discussões. Na presidencial o tema é a economia e o emprego; no caso dos governadores, o tema mais discutido é a segurança pública, e na eleição dos prefeitos se destaca o tópico da saúde pública. O Brasil é formado por um mosaico de 5.568 municípios, mais o Distrito Estadual de Fernando de Noronha e o Distrito Federal, de diferentes regiões e características, portanto não podemos simplificar um complexo contexto político recheado de interesses econômicos e políticos locais. No entanto, a reflexão sobre o tema da saúde pública nas eleições municipais, levantando alguns pontos, pode ser realizada com o objetivo de contribuir com a discussão.
Nas eleições municipais o protagonismo é do processo político local. As questões e demandas sociais que o cidadão possui no seu dia a dia, como as relacionadas à zeladoria das ruas, praças e equipamentos públicos, assistência social e saúde. A saúde assume posição de destaque nessas demandas, pois o cidadão a utiliza em todo o seu ciclo de vida. A maioria das pessoas nasce e morre em um estabelecimento de saúde, e ao longo de sua vida utiliza os seus serviços com muita frequência, seja quando vai ser vacinado ou quando pretende fazer um check-up, ou até mesmo quando realiza uma compra de um gênero alimentício, pois é a vigilância sanitária que libera a venda de produtos para o consumo humano.
A responsabilidade da saúde pública, a exemplo do seu financiamento, não é exclusiva do município. A legislação indica que a responsabilidade é solidária com os Estados e da União, entretanto o cidadão comum não entende essa realidade e no processo eleitoral municipal os participantes não trazem esse tema para discussão. Não se pode negar que o SUS (Sistema Único de Saúde) apresenta problemas de gestão, acarretando problemas técnicos e orçamentários; a mídia, contudo, costuma trazer à tona apenas um ambiente político e social desfavorável para o SUS, falando sempre no caos da saúde pública no Brasil, o que acaba sendo discutido nas eleições municipais, repletas de interesses pessoais e políticos conflitivos.
Estudo a situação da saúde dos municípios brasileiros. Sei, portanto, que muitos deles apresentam bons sistemas, constatados através dos seus indicadores. Por outro lado, encontramos municípios que beiram o caos; seus gestores utilizam do clientelismo e da “ambulância-terapia” como política pública. Há um município que, nos últimos anos, dentre outras ações, organizou a sua atenção básica, requalificou várias Unidades de Saúde na estrutura física, no seu mobiliário e equipamentos, reativou salas de vacinas que se encontravam fechadas, organizou sua rede de urgência e emergência com a ampliação do SAMU, implantou um espaço exclusivo para atendimento pediátrico com uma policlínica de especialidade e uma UPA, implantou um novo sistema para regular exame e consulta de especialidade, implantou uma farmácia 24 horas, garantiu mais de 90% do elenco dos medicamentos da sua relação municipal de medicamentos, criou Distritos Sanitários para aproximar a gestão da saúde com a população. No enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, tomou medidas restritivas precoces para o achatamento da curva de contaminação, objetivo este alcançado através da criação de leitos de tratamento clínico e intensivos exclusivos para pacientes com a Covid-19. Entretanto, neste momento do processo eleitoral de 2020, alguns postulantes apresentam como proposta para a saúde pública a reabertura de uma UPA, cujo fechamento sequer aconteceu.
Apesar das eleições serem municipais, de âmbito local, as soluções para os problemas da saúde pública envolvem o Estado e a União. Atualmente, o Brasil apresenta tripla carga de doenças: as crônicas, principalmente diabetes e hipertensão arterial, neoplasias e as rotuladas como de causas externas (violência interpessoal, acidentes, homicídios), fato que demonstra que será necessária a realização de ações coordenadas entre setores, inclusive com outros municípios, a fim de solucionarmos alguns desses graves problemas, assim como o fortalecimento da atenção básica.
Os programas de governo dos candidatos são elaborados pelo marketing político baseados em pesquisas qualitativas, mas sabemos que o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) já informa que a percepção da população em relação à saúde pública é aumentar o número de médicos, principalmente de especialistas e de exames, ou seja, aumentar o acesso aos serviços, sem preocupação com a sua qualificação. O marketing político, de forma equivocada, apresenta nos planos de governo o incremento da estrutura física, com promessas de construção de novas unidades de saúde e da contratação de mais médicos. Esquece, porém, da mudança dos processos de trabalho, e jamais fazem pactos com a população, que é a principal interessada.
Essas são algumas reflexões sobre a questão da saúde pública e as eleições municipais. Celebremos essas eleições como consolidação da democracia em nosso país, mas não deixemos de instigar os candidatos e eleitores para analisá-las e realizarem uma reflexão sobre as propostas para saúde pública que serão apresentadas nos programas de governo dos postulantes a ocupar o cargo de prefeito.
Luiz Duplat é médico e secretário de Saúde de Camaçari.
*Este espaço é plural e tem o objetivo de garantir a difusão de ideias e pensamentos. Os artigos publicados neste ambiente buscam fomentar a liberdade de expressão e livre manifestação do autor(a), no entanto, não necessariamente representam a opinião do Destaque1.
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