Opinião
Nelson Piquet calado é um poeta, por Sonilton Santos
O ex-piloto brasileiro usou fala racista contra o heptacampeão da Fórmula 1 Lewis Hamilton.
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Sonilton SantosComo se não bastassem os casos de racismo sofridos por clubes brasileiros nos últimos meses, na Copa Libertadores, outro caso de racismo no esporte envolvendo o Brasil ganhou destaque negativo no noticiário mundial. Dessa vez, a vítima não foi nenhum time, federação ou atleta brazuca, e sim o piloto Lewis Hamilton, que foi chamado de “neguinho” pelo ex-piloto Nelson Piquet.
Em sua fala racista, o brasileiro Nelson Piquet acusou com insultos o piloto britânico Hamilton, que poderia, e com todo o direito, dar uma resposta mais dura e à altura. Porém, o que se viu da parte de Lewis foi uma resposta inteligente, educada e com uma classe tão grande e bonita que, se fosse um gol marcado em uma partida de futebol, receberia o prêmio Puskás, concedido ao gol mais bonito do ano.
Em sua conta oficial no Twitter, Lewis Hamilton escreveu em bom e claro português: “Vamos focar em mudar a mentalidade”. Com uma mensagem em inglês, Hamilton encerrou o assunto com chave de ouro. “É mais do que linguagem. Essas mentalidades arcaicas precisam mudar e não têm lugar no nosso esporte. Fui cercado por essas atitudes e alvo minha vida toda. Houve muito tempo para aprender. Chegou a hora da ação”.
Mas qual foi a fala racista que Nelson Piquet pronunciou e fez com que o assunto ganhasse tanta repercussão mundial?
“O neguinho [Lewis Hamilton] meteu o carro e não deixou [desviar]. O Senna não fez isso. O Senna saiu reto. O neguinho meteu o carro e não deixou [Verstappen desviar]. O neguinho deixou o carro porque não tinha como passar dois carros naquela curva. Ele fez de sacanagem. A sorte dele foi que só o outro [Verstappen] se fodeu. Fez uma puta sacanagem”, comentou Piquet após dar entrevista ao jornalista Ricardo Oliveira.
Depois que o assunto repercutiu bastante nos noticiários, Nelson Piquet divulgou uma nota tentando desfazer o “mal-entendido”.
“O que eu disse foi mal pensado, e eu não vou me defender por isso, mas eu vou deixar claro que o termo é um daqueles largamente e historicamente usados de forma coloquial no português brasileiro como sinônimo de ‘cara’ ou ‘pessoa’, e nunca com intenção de ofender. Eu nunca usaria a palavra que estou sendo acusado em algumas traduções”.
Na boa, depois dessa seria melhor ele nem ter se pronunciado. Como assim o termo é um daqueles largamente e historicamente usados de forma coloquial no português brasileiro como sinônimo de ‘cara’ ou ‘pessoa’? Acho que Nelson Piquet deve se achar professor de História e Letras.
Agora vamos saber realmente de quem entende do assunto. Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o advogado Thiago Amparo explicou que o termo “neguinho”, usado por Piquet, é racista por inferiorizar pessoas negras.
“O uso da palavra ‘neguinho’ é uma forma comum de racismo no Brasil porque é empregada em especial para ressaltar algo de errado que se pensa que alguém fez, como quem diz que tal pessoa só poderia ter feito aquilo por ser negra. É uma palavra que, no diminutivo e no contexto, serve para reduzir de forma paternalista pessoas negras a inferiores intelectualmente”, explicou em entrevista à BBC.
Enfim, o que esperar de uma pessoa que deu carona para Jair Bolsonaro no dia do desfile de 7 de Setembro de 2021, quando o bolsonarismo foi às ruas para ameaçar fechar o Supremo Tribunal Federal (STF)? Talvez Nelson Piquet e Bolsonaro tenham muitas coisas em comum. Parabéns para o heptacampeão da Fórmula 1, Lewis Hamilton, pela atitude e postura. E, Piquet, “você calado é um poeta”.
Sonilton Santos é camaçariense, fã de esportes, futebol e praia, estudante de Jornalismo e repórter do Destaque1. Ubuntu!
*Este espaço é plural e tem o objetivo de garantir a difusão de ideias e pensamentos. Os artigos publicados neste ambiente buscam fomentar a liberdade de expressão e livre manifestação do autor(a), no entanto, não necessariamente representam a opinião do Destaque1.
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