Em meio às ruas do Centro Histórico de Salvador, onde a cultura afro-brasileira se manifesta na arquitetura, nos ritos e nas expressões artísticas, a exposição “Encruzilhadas da Arte Afro-Brasileira” passa a ocupar, a partir de 29 de março, quando a capital baiana celebra seus 476 anos, o Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Muncab) como parte da programação do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB).
Com 68 artistas e cerca de 150 obras, a mostra traça um panorama da produção artística negra no Brasil, reunindo desde nomes históricos até expoentes contemporâneos. Em suas exibições anteriores no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, já recebeu mais de 300 mil visitantes, consolidando-se como uma das mostras mais assistidas do ano de 2024.
A curadoria é do pesquisador e curador Deri Andrade, responsável pelo Projeto Afro, plataforma que mapeia artistas negros no país. “A exposição propõe um olhar sobre a presença negra na história da arte brasileira e sua influência nas construções visuais do país. Salvador, com toda sua relevância histórica e cultural, era um destino essencial para essa itinerância. O Muncab, como espaço de referência, amplia ainda mais esse diálogo”, afirma Deri Andrade, curador da mostra.
A exposição será inaugurada no dia 29 de março, e a programação inclui a performance “Do Que São Feitos os Muros” (2020-2025), do artista Davi Cavalcante, que constrói um muro com tijolos gravados com palavras, criando uma reflexão sobre a construção das relações humanas e seus impactos nos territórios.
A exposição segue no Muncab até 31 de agosto de 2025. O museu está aberto para visitação de terça a domingo, das 10h às 16h30. Os ingressos se encontram disponíveis online ou na bilheteria do museu, e custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).
Salvador como ponto de encontro da arte afro-brasileira
A chegada de “Encruzilhadas da Arte Afro-Brasileira” a Salvador intensifica o diálogo entre a produção artística negra e um território historicamente marcado pela presença afrodescendente. No Muncab, as obras se inserem em um ambiente que fortalece as narrativas e ressignifica a memória coletiva da diáspora africana.
A disposição das obras da exposição segue a estrutura já apresentada em outras capitais, mas a conexão com Salvador imprime novos sentidos à mostra. A expografia, concebida pelo arquiteto e cientista social Matheus Cherem e realizada com a produção técnica e executiva de Vinícius Andrade e Vitória Mazzaro, desafia o cubo branco e o padrão estéril do mercado de arte, propondo um espaço de troca e sociabilidade. Nesse labirinto expositivo, o corpo ocupa a centralidade, convidando o público a explorar seus movimentos, possibilidades e embaralhos, sem caminhos pré-definidos, mas com múltiplas leituras e experiências.
A mostra reúne obras que conectam tradição e contemporaneidade para visibilizar a identidade negra em diversas linguagens artísticas, como pintura, escultura, fotografia, instalação e vídeo. As obras estão organizadas em cinco eixos curatoriais: “Tornar-se”, que destaca o ateliê do artista e o autorretrato; “Linguagens”, dedicado aos movimentos artísticos; “Cosmovisão”, que aborda engajamento político e direitos; “Orum”, sobre as relações espirituais entre céu e terra no fluxo Brasil-África; e “Cotidianos”, que discute representatividade.
Entre os artistas homenageados estão nomes como os baianos Lita Cerqueira, Rubem Valentim e Mestre Didi, além de Arthur Timótheo da Costa e Maria Auxiliadora.
O curador Deri Andrade destaca que, ao chegar a Salvador, a mostra se fortalece como um espaço de reconhecimento e valorização da arte afro-brasileira. “A cidade carrega consigo a história e a resistência da população negra no Brasil, o que transforma a experiência da exposição. Essa conexão se fortalece, especialmente com o trabalho de Lita Cerqueira, que há décadas registra a cidade e suas manifestações culturais. Apresentar suas imagens aqui é um reconhecimento da sua contribuição para a memória visual da cultura afro-brasileira”, afirma.
Parceria entre o CCBB e o Muncab
“Encruzilhadas da Arte Afro-Brasileira” é realizada pelo CCBB e o Muncab. O projeto, patrocinado pelo Banco do Brasil por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, possui apoio da BB Asset, tem concepção assinada pelo Projeto Afro e produção da Tatu Cult.
A exposição no Muncab acontece em um momento importante para o museu. Em 2025, a instituição receberá mais de 700 obras de arte afro-brasileiras repatriadas dos Estados Unidos.
A diretora artística do Muncab, Jamile Coelho, ressalta a importância dessa parceria e o impacto da exposição para o museu e para a cena artística da cidade. “A exposição ‘Encruzilhadas da Arte Afro-Brasileira’ afirma a arte negra como eixo central, não desvio. Sua itinerância para Salvador, a cidade mais negra fora da África, fortalece esse enraizamento e amplia o acesso a narrativas antes marginalizadas. O Muncab recebe a mostra como parte de sua missão de preservar, promover e difundir as expressões afro-diaspóricas”.
Para Júlio Paranaguá, gerente-geral do CCBB Salvador, a itinerância reforça o compromisso da instituição com a valorização da cultura afro-brasileira e o acesso democrático à arte. “O CCBB tem como missão ampliar o acesso à arte e à cultura, e trazer ‘Encruzilhadas da Arte Afro-Brasileira’ para Salvador é um marco. A mostra oferece um olhar necessário e abrangente sobre a produção de artistas negros no Brasil, promovendo reflexões sobre representatividade e história. É uma honra contribuir para essa circulação e possibilitar que um público cada vez maior tenha contato com esse acervo”.