Opinião
Camaçari precisa urgentemente efetivar políticas públicas para assegurar a vida da população LGBTQIAP+, por Hilton Coelho
É o que nos mostra o caso André, estudante do Colégio Estadual José Freitas Mascarenhas.
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Hilton CoelhoO caso do estudante André, de 15 anos, do Colégio Estadual José Freitas Mascarenhas, em Camaçari, espancado, há pouco mais de uma semana, por outros adolescentes da mesma escola, é o mais recente exemplo local da intensificação da violência LGBTfóbica no Brasil.
Camaçari é um microcosmo do que vem acontecendo no país, em que políticas de morte se atualizam e intensificam nas instituições estatais, especialmente após o processo eleitoral de 2018, que resultou na eleição de um presidente antirrepública, protagonista do fortalecimento das manifestações de ódio contra a população LGBTQIAP+ e de toda a agenda dos direitos humanos.
É nesse contexto que, de 2019 a 2020, houve um aumento de 41% no número de mortes violentas de pessoas trans no Brasil, que continua liderando como o país mais letal para essa população no mundo. Foi o que revelou, em 2020, o relatório da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra). O termo “continua” é muito grave. Isso porque há 12 anos essa estatística vergonhosa não somente se mantém, mas vem sendo intensificada pela LGBTfobia.
Chama a atenção o crescimento de notícias sobre crimes com características LGBTfóbicas na cidade. Em 2012, irmãos gêmeos que dançavam juntos numa festa de São João foram brutalmente agredidos a pedradas. Um deles foi a óbito em meio à praça pública.
Nos últimos três anos, outros episódios engrossaram essas estatísticas sangrentas, como a execução da jovem Camury Rosa, vítima de lesbofobia e morta a tiros, aos 20 anos, em sua residência, no bairro do Gravatá. Há também os casos de tentativa de homicídio, em 2020, de um casal gay por um homofóbico, que chegou a alvejar com quatro tiros um dos companheiros; e o assassinato de uma mulher trans no centro de Camaçari, em 2019. Todos esses episódios mostram flagrantemente como a população LGBTQIAP+ tem uma rotina sitiada pelas expressões do ódio machista.
De acordo com a Constituição, a educação está no bojo de uma série de direitos garantidos pelo texto no Artigo 227, que determina afastar os jovens da discriminação, violência, crueldade e opressão. Diante disso, precisamos cobrar investimentos e políticas públicas efetivas, tanto do governo municipal quanto do Estado. Esse é o único caminho para que essas situações de violência parem de se repetir como parte da rotina da cidade e terror constante para jovens e adolescentes LGBTQIAP+.
Outro marco legal que precisa ser lembrado é o Plano Nacional de Educação (PNE), de 2014. O texto reforça a promoção da diversidade e a necessidade de erradicar todas as formas de discriminação como diretrizes do ensino brasileiro. Esses princípios tomam corpo na estratégia 13, da meta 3, relacionada ao ensino básico, que prevê ações para combater a evasão escolar motivada por preconceito ou qualquer forma de discriminação. Observando o Plano Municipal de Educação da cidade de Camaçari, em todo o capítulo de metas e estratégias não há definição de ações objetivas ou subjetivas para combater a evasão por discriminações, violências e preconceitos. Isso demonstra uma ausência de prioridade do poder público municipal no combate à LGBTfobia.
Luta e resistência
Quando existem, além de serem tímidas as concretizações de políticas de garantias dos direitos humanos da população LGBTQIAP+, o que percebemos é um retrocesso e mesmo um estímulo institucional velado aos crimes LGBTfóbicos, quando gestores e governantes expressam publicamente o seu alinhamento ao ódio de gênero. O silêncio institucional é criminoso. E precisa ser derrotado.
Por isso, o mandato que assumo como titular, mas que é popular e de escuta coletiva, vem travando uma intensa luta pelos direitos da população LGBTQIAP+ no Legislativo baiano, levando para esse espaço de poder a luta que já é realidade fora dele.
Já propusemos diversos Projetos de Lei e de Indicação, que tramitam na Assembleia Legislativa da Bahia, como o PL 24.120/2021, que demarca o obrigatório respeito ao uso do nome social nas lápides e atestados de óbito de travestis, mulheres transexuais, homens transexuais e demais pessoas trans.
Tramita também a Indicação 24.401/2020, que sugere ao governador do Estado da Bahia a inserção da população trans e travesti nas campanhas e políticas de saúde, a exemplo da “Campanha do Outubro Rosa”, que deve contemplar todas as formas de ser mulher, levando em consideração as suas especificidades, tais como o direito aos serviços de atendimento para investigação e diagnóstico do câncer de próstata, com consultas e exames que incluam suas demandas de saúde, assim como a inserção dos homens trans e pessoas transmasculinas na “Campanha do Novembro Azul”.
A criação de Programa de Atendimento Psicológico específico para atender às necessidades da população LGBTQIAP+ nas Unidades Básicas de Saúde do Estado também foi uma indicação nossa, além de outras indicações e projetos que estimulam a realização de atividades culturais e socioeducativas desenvolvidas em parceria com a comunidade LGBTQIAP+. Tudo isso visando o diálogo, a visibilidade e a conscientização da sociedade civil sobre diversidades sexuais e de gênero, notadamente no ambiente escolar, que deve ser um espaço de transformação, de construção da capacidade coletiva de vivermos democraticamente, jamais um palco intenso de violência LGBTfóbica.
Mudar esse cenário de terror que acomete a população LGBTQIAP+ é obrigação de todos, todas e todes que almejam uma sociedade mais democrática. Se quisermos avançar na consolidação da justiça social, esse desejo de aniquilamento da população LGBTQIAP+ precisa ser alvo, não só de profunda reflexão, mas de iniciativas institucionais urgentes para interromper a brutal violência contra as pessoas que não se enquadram nas identidades impostas pelo modelo de sociedade colonial/patriarcal.
Hilton Coelho é deputado estadual (Psol-BA), historiador, ativista dos movimentos populares e membro da Comissão de Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia e Serviço Público, assim como de Direitos Humanos e Segurança Pública, titular da Comissão Especial da Promoção da Igualdade na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba).
*Este espaço é plural e tem o objetivo de garantir a difusão de ideias e pensamentos. Os artigos publicados neste ambiente buscam fomentar a liberdade de expressão e livre manifestação do autor(a), no entanto, não necessariamente representam a opinião do Destaque1.
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