Opinião
A cultura do ‘ficar’ está colocando em risco o amor?
Como se configuram as relações na pós-modernidade.

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Laiana FrançaHá muito tempo, o amor romântico tem sido a maior busca para alcançarmos aquilo que definimos como uma vida feliz. Aclamado pelos poetas, nas telas dos pintores, interpretado por atores e homenageado em músicas, o amor, a busca por ser amado é o anseio que atravessa gerações. Ainda assim, na atualidade existe uma crescente postura que coloca em risco o maior de todos os sentimentos.
Ao longo da História, os modelos de relacionamentos se modificaram, seguindo as necessidades das massas e os costumes. No século XIX, foi fortalecida e disseminada a ideia de uma dicotomia entre os gêneros. Para o homem estaria a inteligência, a razão e as tomadas de decisões, enquanto que as mulheres representavam o coração, a sensibilidade e os sentimentos. A construção da família era vista e pautada na formalização de um contrato, que tendia à garantia de títulos, mantimentos de posições sociais e econômicas. A organização do matrimônio era condicionada por leis estabelecidas pelo Estado, a igreja e a moral, uma relação de submissão e dominância que retirava o amor do centro.
Todavia, surgiram mudanças profundas, principalmente nos âmbitos econômico, sociocultural, religioso e no contexto psicológico. No âmbito econômico, o surgimento de eletrodomésticos, dos congelados, creches e outros mudaram substancialmente o modelo relacional familiar, especialmente para a mulher, nas tarefas a ela delegadas. Já o avanço científico possibilitou à mulher o domínio da sua própria sexualidade, permitindo a ela prevenir-se contra uma possível gravidez, por exemplo, juntamente com a onda feminista na década de 60, que colocou em discussão a desigualdade entre os gêneros e questionou os modelos socioculturais e religiosos que subjugavam a existência feminina e reduzia sua participação na sociedade.
Na década de 60, também houve progressos na área da educação superior, as escolas de graduação e as fundações começaram a estimular as mulheres a ingressar na carreira acadêmica e na política. A classe média expandiu-se e houve melhorias nas condições de vida. A luta pela educação para as mulheres fez com que as diferenças entre homens e mulheres diminuíssem. Desse modo, com maior autonomia e participação feminina na sociedade, as formas de se relacionar mudaram.
Nesse ponto, a mulher antes ofertada por dotes, condicionada a casar pela escolha paterna ou de seus tutores, assume o comando de suas escolhas e se apresenta também como ser sexual e racional. Retira-se a ideia romântica de pureza e assume o que a literatura brasileira chamou de realismo, a mulher como persona que permite ser desejada, mas que também deseja. A narrativa muda, e as fêmeas passam a ser também caçadoras, e não apenas presas.
A base sociocultural modifica-se também para os homens, com uma maior facilidade de obter contato sexual. A busca pela construção de uma matrimônio ou relacionamentos com envolvimentos sentimentais se torna objetivo secundário ou inexistente. A construção das relações se fundamentaria no prazer de saciar o desejo. Não há espaço para o amor. No que erramos?
Segundo o sociólogo Zygmunt Bauman, em tempos de pós-modernidade e globalização, as relações são liquidas, e nada é feito para durar. Logo, embora exista o desejo de amar e ser amado, o sujeito carente de amor, para poder viver em plenitude, contraditoriamente, não consegue encontrar o amor, e, caso o encontre, tende a fugir dele por medo de sofrer.
Relacionar-se nos anos 2000 exige muito mais do que apenas o desejo de amar e ser amado. Uma nova narrativa se fez presente, algo nunca antes vivenciado. A vulnerabilidade das relações morreu com a retórica de não parecer “emocionado”. As borboletas no estômago foram mortas. O encantamento e o romantismo perderam espaço paro o ego e a superficialidade. Os sentimentos são comercializados, e o consumo governa os envolvimentos atuais.
Se o desejo quer apenas consumir, o amor quer possuir. Enquanto a realização do desejo coincide com a aniquilação de seu objeto, o amor cresce com a aquisição deste e se realiza na sua durabilidade. Se o desejo se autodestrói, o amor se autoperpetua.
O “ficar”, etapa que nos dias atuais antecede um passível namoro, não é uma mudança comportamental isolada, e sim o reflexo de uma sociedade composta por pessoas mais centradas em si mesmas. É a subtração no bônus da experiência sensorial, e o compromisso representa o ônus. O desapego é pregado como estilo de vida, a poligamia ganha força, o superficial é celebrado, e o amor perde protagonismo.
Laiana França é mercadóloga, pós-graduanda em Gestão Empresarial e estudante de Direito, além de feminista e militante dos direitos humanos.
*Este espaço é plural e tem o objetivo de garantir a difusão de ideias e pensamentos. Os artigos publicados neste ambiente buscam fomentar a liberdade de expressão e livre manifestação do autor(a), no entanto, não necessariamente representam a opinião do Destaque1.
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